Os judeus em oposição aos impérios seguem uma linha de fuga no deserto, o povo escapa da rede imperial egípcia. Moisés e os hebreus em relação aos nômades guerreiros e ferreiros, essa tribo em marcha não vem dos agricultores enraizados. O nomadismo torna o povo hebreu em fuga pelo deserto, exterior ao império egípcio, esta exterioridade faz com que o povo judeu seja desterritorializado[1] em busca de sua terra prometida, Jerusalém Celeste que se estende durante séculos até o período de sua captura nos campos de concentração nazista e suas experiências médicas, eutanásia e programas de matança de loucos. Sem deixar de considerar a sua escravidão no Egito os tornando produtores e trabalhadores na cultura ocidental.
O produtor universal é o esquizofrênico, não se pode distinguir o produzir e o seu produto: produzir sempre o produzir, produção de produção, como definiu Gilles Deleuze e Félix Guattari em “O Anti-Édipo: Capitalismo e Esquizofrenia”. Com o desenvolvimento da força produtiva (do trabalho) e do emprego capitalista das máquinas, que só tendem a diminuir o preço das mercadorias e tornar menor a parte da jornada que o operário trabalho para si próprio, a fim de prolongar a outra parte em que trabalha para o capitalista: mais-valia relativa, como definiu Marx em “O Capital”, a máquina-ferramenta substituiu a simples ferramenta e realizou uma revolução, mas o homem continuou servindo de motor.
O servo-motor, nos dias atuais, da inteligência artificial é o cérebro-motor, de acordo com Paul Virilio em “A Arte do Motor”. A história do modelo meteorológico de Edward Lorenz sobre a teoria do caos remonta do início da década de 1960, quando os computadores eram pouco poderosos e lentos para formulação de modelos atmosféricos e previsão do tempo, que consumiam uma enorme massa de dados a serem processados – erros e incertezas faziam da previsão do tempo em longo prazo seria inviável[2].
A loucura foi considerada como um mundo nebuloso e incoerente que vem turvar o mundo real, que desorganiza a ordem e o tempo, assim descreveu Michel Foucault em “Ditos e Escritos, vol. I”, do mesmo modo em que turbilhões de ventos sopram em todos os sentidos: é o mundo da desordem, de um espaço ainda não orientado, Jean-Pierre Vernant em “Mito e Pensamento entre os Gregos, repensou um mundo em que todas as direções do espaço estão misturadas em um caos inextricável, na confusão de cima e de baixo, da direita e da esquerda –, este mesmo mundo não possa mais emergir a luz.
As máquinas desejantes, o objeto-sujeito do desejo, como os atratores estranhos da teoria do caos, serve de pontos de ancoradouros no interior de um espaço de fase[3], sem ser jamais idêntico a si mesmo, em fuga permanente sobre uma linha fractal[4]. Enquanto o esquizofrênico está como que instalado em pleno centro dessa fenda caótico, o delírio paranóico manifesta uma vontade ilimitada de se apossar dela. Interações entre o corpo e o espaço construído se desdobram através de campos cuja complexidade beira ao caos: equivalente aos ‘atratores estranhos’ da termodinâmica dos estados distantes do equilíbrio poderia ser baseado aos regimes de signos (ciências, artes, filosofia – significante e pós-significante) que habitam secretamente o caos urbano e arquitetural.
Não se trata mais aqui de uma ‘Jerusalém Celeste’ como a do Apocalipse, mas da restauração de uma ‘Cidade Subjetiva’ que, segundo Félix Guattari em “Caosmose”, engaja tanto nos níveis mais singulares da pessoa quanto os níveis mais coletivos. São peças das engrenagens urbanísticas e arquiteturais que devem ser tratadas como componentes maquínicos, que são antes de tudo, produtores de subjetividade, eles são mais que uma estrutura ou sistema em sua acepção comum.
Edward Lorenz constituiu o modelo teórico do caos determinista, o ‘efeito borboleta’[5]: uma pequena perturbação pode um mês depois ter um efeito considerável, conforme o livro “Dos ritmos ao Caos” escrito por Pierre Berge, Maurice Pomeau e Monique Dubois-Gance. A hipótese do aquecimento global provocada por atividades humanas (antrópica), pelo efeito da urbanização (ilha de calor) contando que a Geografia estuda o funcionamento e a dinâmica dos elementos do geossistema e do sistema socioeconômico, componentes interligados e são interligados.
O princípio do aumento da ordem (PAO) ligado à noção de atrator imaginada por Lorenz, o qual amenizaria o ‘Efeito Borboleta’, de acordo com Antonio C. Vitte e Antonio J. T. Guerra em “Geografia Física no Brasil” –, os sistemas seriam então atraídos para um limite do qual eles não passam, em contraposição ao princípio do aumento da desordem. Trata-se de rememorar a esquizofrenia como limite do capitalismo?
Neste sentido, a máquina[6] desejante capitalista é posterior à máquina celibatária e à máquina paranóica, respectivamente, definidas por que nasce uma nova humanidade, sujeito produzido que resta, o esquizofrênico situa-se no limite do capitalismo; com seus suplícios, as sombras e suas leis que suplicia e mata; pelo clamor suspenso entre vida e morte intenso sentimento de passagem, falam-se de delírios, alucinações. Lewis Mumford criou a palavra ‘mega-máquina’: máquina social como entidade coletiva, mega-máquinas urbanas: ‘ilhas de calor’. A máquina humana é uma verdadeira máquina – combinação de elementos sólidos cada um dos quais com sua função especializada, funcionando sob controle humano para transmitir um movimento e executar um trabalho.
[1] A exterioridade da máquina de guerra nômade e sua interiorização pelo Estado, o êxodo de Moisés e seu povo e a relação da desterritorialização do homem com a terra: quando Moisés faz sua grande composição de deserto onde está exposto à influência nômade e recenseia as tribos especiais dos levitas. Cf.: Deleuze e Guattari em ‘Mil Platôs: Capitalismo e Esquizofrenia Vol. V’.
[2] Sobre a vida e obra de Edward Lorenz Cf.: Vitte e Guerra (Geografia Física no Brasil); Berge, Pomeau e Dubois-Gance (Dos Ritmos ao Caos).
[3] Espaço abstrato no qual os eixos representam as variáveis que caracterizam o sistema. Compreende duas regiões distintas, uma corresponde ao movimento positivo e outra ao negativo. Cf.: Prigogine (O Fim das Certezas) e Guattari (Caosmose).
[4] Geometria fractal, da natureza, diferente da euclidiana. Cf.: Gleick (Caos).
[5] A célula de Hadley – a relação entre pressões (temperatura) e os ventos em rotação (no globo) deslocando de área da alta pressão (30°) temperadas à área equatorial (0°), pode corresponder à máxima de Lorenz: “Does the flap of a butterfly’s wings in Brail set off a tornado in Texas?”
[6] A máquina é definida nesta abordagem por extrair, destacar e restar um fluxo, máquina que se define como sistema de cortes.
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