Marx e a análise diferencial entre trabalho nu e capital (fluxo de trabalho e o fluxo de capital). A moeda de crédito (comercial ou bancário) e o crédito bancário (desmonetarização da moeda) dão à ‘dívida infinita’ sua forma capitalista. Will ou Gabriel Ardant, segundo Gilles Deleuze e Félix Gauttari em “Mil Platôs: Capitalismo e Esquizofrenia vol. V”, mostraram que a função comercial não deu origem a moeda, mas provam que o mundo grego e ocidentale os impérios do oriente, o monopólio de um comércio monetarizado nos parece supor o imposto monetário, de tal sorte que os meios que deram origem ao imposto deram igualmente origem à moeda: é do imposto, portanto, não do comércio que a forma-dinheiro nasce. A dívida que se estabelece entre estes impérios e formações pré-capitalistas asiáticas, por exemplo, se estabelecem através do estoque de trabalho (lucro do empreiteiro), terra (renda do proprietário) e moeda (imposto do banqueiro). O déspota é portanto proprietário da terra, empreiteiro dos trabalhos e senhor dos impostos e dos preços – três capitalizações do poder.
Se as comunidades primitivas se organizam em torno da terra e através da marcação e aliança, nenhum fluxo de corpos se descodifica: os primitivos são marcados e aliados sem ‘estoque filiativo’ e, com efeito, dívida finita. Entre os bárbaros, o Estado não pode ser refutado e um poder central é demarcado na imagem do soberano. Por um lado, os blocos de dívidas filiativas se tornam referentes ao deus-déspota: Bruto, por exemplo, de acordo com Giorgio Agamben em seu “Homo Sacer”, que, mandando à morte seus filhos, adotou em seu lugar o povo romano. Por outro, economia de subsistência ou sociedade da abundância, conforme Pierre Clastres em “A Arqueologia da Violência”, os povos primitivos se opõem aos bárbaros, medievais que, sob o império judaico-cristão e romano, fez surgir o mercador-banqueiro que definia a concepção da dívida infinita.
Parte-se da concepção de F. Kafka, Gilles Deleuze e Félix Guattari em “O Anti-Édipo”, a lei imperial bárbara tem duas características (paranóico-esquizóide) governo as partes compartimentando-as não permitindo a comunicação e a lei (maníaco-depressivo) não faz conhecer o objetivo que se quer conhecer: a lei é a invenção do próprio déspota: a forma jurídica que torna a dívida infinita. O soberano como lei viva é anomos – nomos[1] e anomia no corpo vivo do soberano coincidem lei e anarquia em sua pessoa. A lei viva (nomos empsycho) só pode significar que ele não é obrigado por ela. Nomos empsycho é, para Giorgio Agamben em “Estado de Exceção”, a forma originária do nexo entre um fora (o anômalo, o outsider)[2] e um dentro da lei.
Sigmund Freud em “Totem e Tabu” demonstrou como a técnica do animismo, da magia dos reis revela uma intenção de impor leis que regem a vida mental às coisas reais. Os reis atribuíam, entre outras técnicas animistas, o poder sobre a chuva, o sol, o vento e o clima, principalmente em relação às práticas agrícolas. Enfatizam-se as leis vivas, físicas (nomos) em relação ao clima e posteriormente às questões psicológicas, psiquiátricas (empsycho). Se o rei, como monstro moral, ilustrado por Michel Foucault em “Os Anormais”, tornou-se o grande modelo dos inúmeros monstrinhos que vão povoar a psiquiatria e a psiquiatria legal do rei do século XIX. A desrazão foi aquática, mais precisamente oceânica, na imaginação ocidental no século XVIII, mas no século XIX, o ar voltou a ser o elemento da loucura, mutação importante no espaço imaginário da loucura. Das naus dos loucos ao internamento, o tipo de prática terapêutica dos desatinados e loucos se refere ao caos, desordem que a loucura inspirou a imagem normativa ocidental, nas palavras de Michel Foucault em “Ditos e Escritos vol. 1”. A matança dos loucos, ordenada por Hitler, descrita por Hannah Arendt em “Origens Totalitarismo”, no começo das guerras do século XX – Karl Brand, um dos médicos encarregados de executar o programa da eutanásia nos campos de concentração, a transformação de morto-vivos tinha por objetivo manipular o corpo humano de forma a fazê-lo destruir a pessoa, tão implacavelmente, como certas doenças mentais de origem orgânicas. O doutor Roscher, em 1941, prosseguiu seus experimentos para aviação como possível por dois a três delinqüentes como VP (Versuchepersonem – cobaias humanas) e experiências sobre a potabilidade da água marinha. Sobre a condição das VP condenadas a morte ou detentos em um campo, conferir em “Homo Sacer” de Giorgio Agamben, portanto, não só matança, mas experiências técnicas médicas de guerra.
[1] O nomos acabou designando a lei, mas antes era a forma distribuir homens e animais no espaço aberto. Cf.: Deleuze e Guattari (p. 51), Mil Platôs. Vol. 5.
[2] O feiticeiro é o outsider, o anômalo para Deleuze e Guattari, o demônio que transporta humores ou mesmo corpos, individuações sem sujeito, hecceidade : latitude e longitude de um corpo.
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